O Secretariado distrital da União Geral de Trabalhadores (UGT) aprovou uma Moção, intitulada “A falácia da digitalização no interior” que aponta as visíveis discriminações que quer o governo quer a União Europeia continuam a praticar no interior do país.

Segundo a UGT, “os portugueses têm estado expostos à banalização do termo “digitalização”, ou mesmo da “transformação digital”. Mais ainda no interior do país. Decorre de objectivos que a União Europeia quer ver cumpridos, e, por arrasto, de uma exigência que passa a ser dos Estados-membros, em nome do progresso, do desenvolvimento global e da promoção da coesão social e territorial. Para a UGT Portalegre, o primeiro objectivo digital deveria ser tornar um país todo igual, o nosso, mas assim não acontece. No Alentejo, por exemplo, entre as capitais de distrito (aquelas que eram para passar a estar ligadas por ferrovia através do PRR – Plano de Recuperação e Resiliência, mas que o Governo reconsiderou para pior), em Portalegre, na N18 ou no IP2, entre Évora e Beja, e a seguir para sul, não há civilização. Ela só volta a existir quando chegamos ao Algarve. Já para não falar das falhas na A2 – auto-estrada do sul, a que foi menina dos olhos do Governo de então. Na realidade, o que verificamos é cada vez menos acessos, menos cobertura, menos interligação, e mais despesas com operadoras e maior distanciamento social, ainda que se apregoem “avanços”, como é o caso do teletrabalho ou do trabalho remoto, com recurso a tecnologias de informação e comunicação. ‘Avanços’ que teriam que implicar a salvaguarda dos direitos dos trabalhadores, assim como as devidas condições para poderem desenvolver as suas funções, algo que a actual ‘transformação digital’ não suporta. As operadoras parecem brincar com as pessoas, e a regulação do sector das comunicações, realizado por quem coadjuva o Governo nestes domínios, deixa muito a desejar. A isto soma-se a existência de um quinto da população portuguesa pobre, e que a maior parte das pessoas em situação de pobreza trabalha”, aponta a estrutura sindical..

Já à prometida cobertura total do país por parte das operadoras de telecomunicações e mesmo ao preço praticado nos contratos, a UGT aponta a morosidade do processo, voltando a acusar o governo nesta matéria. Consideram os sindicalistas que “abafando este estado actual, o Governo embandeira com o agora previsto no PRR, em termos de interligação, garantindo que, até 2025, haja a cobertura 5G ininterrupta mais ampla possível para todas as áreas, incluindo áreas rurais e remotas.

Quanto a este historial, recordamos que, em Março de 2016, as operadoras foram obrigadas a alargar banda larga móvel a mais 588 freguesias, tendo um ano para dividir entre si as freguesias e um ano para assegurar cobertura de até 75% de população em cada freguesia (um serviço de banda larga móvel que permita uma velocidade de transmissão de dados de 30 Mbps – velocidade máxima de download), só assim podendo renovar as suas licenças por mais 15 anos pela Anacom. Estas juntaram-se às 480 freguesias que a Anacom já tinha determinado obrigações de cobertura aquando do leilão para as licenças para o 4G. De entre estas, o maior número de freguesias estava entre os distritos do interior, como Bragança (73) a liderar, seguida de (Beja), Guarda (57), Évora e Castelo Branco (55 cada), Vila Real (46), Portalegre (38), Faro e Santarém (27).

Mais recentemente, no passado mês de Maio, a Anacom renovou as licenças agora só com a MEO e a Vodafone, até 2033, mas obriga a reforçar cobertura em mais 100 freguesias. Desta feita, nenhuma delas situadas em distritos do interior, mais ainda no transfronteiriço.

O que se pretende é maior cobertura, maior flexibilidade, custo mais reduzido. Exigindo-se uma maior aceleração, agora ainda mais devido à Covid-19. Mas, ao contrário, a UGT Portalegre tem conhecimento de quem tenha que sair de casa e deslocar-se para dentro de um galinheiro para conseguir ter cobertura de rede.

A somar a tudo isto, deveria ser continuamente publicitada uma comparação do preço da internet com os outros Estados-membros, apelando à igualdade, e que nos deveria obrigar a sermos mais exigentes, o que também não acontece. Acrescem ainda potenciais receitas não recebidas para o Orçamento de Estado. Soube-se recentemente que, só em relação aos meios de comunicação social portugueses, os 15 milhões anunciados pelo Governo para os apoiar são um sétimo do que podia ser cobrado à Google e ao Facebook em impostos, que, se pagassem impostos em Portugal (IVA e IRC), dariam mais de 100 milhões ao fisco por ano (que não revelam dados concretos sobre as

reais receitas com a publicidade digital que arrecadam em cada país). Isto enquanto se sente uma cada vez maior necessidade de cibersegurança”, alerta o Secretariado distrital.

Regionalização seria a solução

Segundo a estrutura sindical, “no âmbito regional, e como exemplo de iniciativas supramunicipais, temos a Comunidade Intermunicipal do Alto Alentejo (CIMAA), em parceria com a Entidade Regional de Turismo do Alentejo, a adquirir infra-estruturas, equipamentos e serviços de Wi-Fi, com o objectivo de melhorar e desenvolver acessibilidades digitais para turistas e residentes, tendo como principal base orientadora a coesão do território e o fortalecimento de um conceito integrado de promoção turística do Alto Alentejo. A UGT Portalegre questiona, por isso, se estará na hora de reconsiderar a Regionalização. Até porque esta é a mesma digitalização que leva ao encerramento de agências bancárias e outros serviços por todo o interior, não promovendo as relações interpessoais, e que não aproxima os representantes políticos das pessoas.

E perguntamos ainda se será verdadeiro este apelo à vinda para o interior nos moldes actuais. Para lá do que o Governo faz bem feito, com todos os incentivos que tem proporcionado, mantemo-nos subjugados aos privados, e continuamente conhecemos aldeias inteiras sem contacto com o exterior. Parecem andar a brincar com quem trabalha e a incrementar um cada vez maior aumento do envelhecimento e isolamento do interior. Caminhamos para uma desvalorização do humanismo perante o avanço da digitalização, e ainda agitam uma regulação através da Carta dos Direitos Humanos da Era Digital, em vésperas da sua entrada em vigor”, aponta a UGT.

Por fim, a UGT termina “relembrando que já para Charles Dickens, que viveu no séc. XIX, ‘a comunicação eléctrica nunca será um substituto para o rosto de alguém, que com a sua alma encoraja outra pessoa a ser brava e verdadeira`’”, remata.

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