As “brigas do faz-de-conta” das crianças, aquelas em que fingem uma disputa física entre si, fazem bem à saúde mental dos mais novos, defende um projeto de investigação coordenado por uma investigadora da Universidade de Évora (UÉ).
Em comunicado enviado à agência Lusa, a academia alentejana revelou tratar-se de um “projeto de investigação pioneiro”, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e coordenado por Guida Veiga, professora no Departamento de Desporto e Saúde da UÉ.
O estudo está a ser implementado em jardins-de-infância dos concelhos de Évora e Redondo e envolve cerca de 150 crianças, com idades entre os 3 e os 6 anos.
Segundo a universidade, as brincadeiras de lutas, “aquelas que as crianças fingem disputar fisicamente entre si”, são “animadas e barulhentas [mas são], muitas vezes, vistas com desconfiança por pais e educadores [e] frequentemente rotuladas como perigosas ou inapropriadas”.
A investigação está a mostrar exatamente o contrário, porque “estas interações físicas espontâneas podem ser cruciais para o desenvolvimento saudável das crianças e até para a promoção da sua saúde mental”, argumentou Guida Veiga, também investigadora do Comprehensive Health Research Centre (CHRC) da UÉ.
Segundo esta investigadora na área da saúde e desenvolvimento infantil, as chamadas “brincadeiras de lutas” são uma oportunidade única para que as crianças aprendam a conhecer melhor o seu corpo e a regular as suas emoções e comportamentos nas interações com os pares.
“Estas interações envolvem contacto físico, controlo emocional e motor e uma sincronização social que são fundamentais para a saúde e o bem-estar das crianças”, explicou, citada no comunicado da UÉ.
O estudo foca-se nos efeitos destas brincadeiras “no desenvolvimento da autorregulação, da compreensão das emoções, das competências sociais e dos níveis de ‘stress’, avaliados através de testes, questionários e até biomarcadores como o cortisol, a amilase, a oxitocina e a melatonina”, avançou.
Também a formação teórico-prática das educadoras de infância está abrangida no projeto e é mesmo “uma componente central” do mesmo, com estas profissionais a receberem orientação científica sobre o tema e a experimentarem elas próprias as brincadeiras, “muitas pela primeira vez”, disse a academia.
“No início tínhamos algum receio. Mas agora conseguimos observar e perceber que, de facto, elas [as crianças] estão a brincar e a desenvolver capacidades muito importantes”, relatou uma das educadoras, citada pela universidade.
A mesma profissional acrescentou que as educadoras já conseguem dar “mais liberdade” às crianças para brincarem: “Vemo-las tão felizes!”.
E, num artigo científico publicado no mês passado sobre as perceções das crianças, foi mostrado que “mesmo na idade pré-escolar, muitas já conseguem distinguir claramente uma luta real de uma brincadeira de luta”.
Além disso, o estudo identificou indícios de estereótipos de género já enraizados nesta faixa etária, porque algumas meninas disseram que “brincar às lutas é coisa de meninos”, mas que gostariam de o fazer se fossem rapazes, o que revela “como as expectativas sociais podem limitar o brincar”.
As sessões com as crianças, realizadas duas vezes por semana ao ar livre, prolongam-se até final deste mês. Depois, será feita uma avaliação final para análise dos efeitos do programa e as investigadoras pretendem entrevistar as educadoras para perceber como a experiência transformou as suas práticas e perceções.
“À medida que mais dados são recolhidos, uma ideia já começa a ganhar força: talvez esteja na hora de repensar o que é ‘seguro’ e ‘adequado’ no brincar infantil”, realçou a UÉ.
E também, acrescentou, “reconhecer que, quando acompanhadas com sensibilidade e confiança, até as lutas a brincar podem ensinar a cuidar”.

RRL // FPA

Carregar mais artigos relacionados
Carregar mais artigos por Redacção
Carregar mais artigos em Actual

Veja também

Emergência em Vila Viçosa exige transporte aéreo para Lisboa

Hoje, pelas 12h49, os Bombeiros de Vila Viçosa foram acionados pelo CODU para prestar auxí…