O futuro do actual governo pode ficar decidido no próximo fim-de-semana. E não será por vontade de PSD ou PP, mas sim por determinação de PS, BE e PCP. Com a política em modo ‘ac/dc’ (antes de Costa e depois de Costa), os socialistas reúnem-se sábado (Comissão Nacional) e domingo (Comissão Política), percebendo-se, então, se o segundo partido mais votado nas eleições de Outubro mantém a inclinação para a esquerda e rejeita o governo de direita ou se, pelo contrário, se desliga de BE e PCP e deixa passar o executivo de Passos Coelho.
Estas duas reuniões de fim-de-semana serão decisivas para perceber o posicionamento dos socialistas. Segunda-feira inicia-se a dupla jornada parlamentar com duas certezas – PSD e PP apresentam e defendem o programa de governo e BE e PCP cumprem a promessa de avançar com moções de rejeição. Falta, portanto, a definição do PS, num momento em que as negociações à esquerda estão presas por pormenores.
«Podemos dizer que há um a.C e um d.C.. Deu uma ‘machadada’ na tradição política e na própria geometria de poder, por três razões: porque quem ganhou as eleições de há um mês poderá não ser quem ficará a governar. Porque foi Costa quem perdeu as eleições, não se demitiu e prepara-se para subir ao poder através do Parlamento (quanto tempo? A incógnita é tal que ninguém arrisca prognósticos). E, por fim, porque esta subida se fará (ainda não está fechado) alavancada em dois partidos com quem o PS tem mantido há anos uma relação (quase) antagónica e de guerrilha: o BE e o PCP» – Adelino Maltez (politólogo)
Vista do Alentejo, a crise política terá um desfecho pela esquerda. Pelo menos tendo em conta a interpretação dos líderes das estruturas distritais socialistas de Portalegre e Évora, respectivamente Luís Moreira Testa e Capoulas Santos.
Citando Carlos César (presidente do PS), Moreira Testa considera que qualquer socialista deve preferir um governo do PS apoiado pela esquerda a um governo de direita com o apoio da bancada “rosa”. Assumindo que tem a noção que as negociações, com BE e PCP, estão a chegar à fase final, declarou ao Linhas: “Os acordos estão presos por questões de pormenor, mas mesmo estas terão de ser acauteladas… Podem ser ratificadas no fim-de-semana”.
Por Évora, Capoulas Santos diz que o processo em curso poderá significar uma “mudança de paradigma”. Riscos? A vida é feita de riscos e sem eles Afonso Henriques não teria fundado o reino, nem os conjurados se teriam revoltado em 1640.”Sem riscos não teríamos República nem os capitães teriam avançado para o 25 de Abril”, acrescenta.
Mas o acordo à esquerda não é uma solução pacífica no PS. Entre os críticos tem surgido o nome do eurodeputado Francisco Assis. Capoulas Santos aceita a existência de divisões, mas adverte: “Serão substancialmente menores do que aquelas que existiriam se o PS se transformasse no sustentáculo do governo de direita”.
«Espero que a matriz ideológica do PS seja preservada e que o seu eleitorado perceba, verdadeiramente, todas as consequências desta conjugação de votos» – Aníbal Reis Costa, presidente da CM Ferreira do Alentejo (PS)
À direita, não há dúvidas. Um governo liderado pelo PS seria “ilegítimo”.
Na RR, Marco António Costa, vice-presidente do PSD, foi claro: “O PS não pode querer construir uma coligação verdadeiramente negativa para nos derrubar e depois, naquilo que vier a ser importante para se poder manter no poder, estar a contar que pode ter como muleta o PSD”. E acrescenta que nem mesmo para compromissos internacionais o PSD aceitará ser “muleta de um Governo ilegítimo”.
«A Assembleia da República não pode ser dissolvida nos seis meses posteriores à sua eleição, no último semestre do mandato do Presidente da República ou durante a vigência do estado de sítio ou do estado de emergência» – Artigo 172.º | Constituição da República Portuguesa
Com a apresentação do programa de governo nos dias 9 e 10 de Novembro, na Assembleia da República, e tendo em conta a possibilidade de a esquerda unida “chumbar” o executivo PSD/PP, a resolução da crise política volta às mãos do Presidente da República. Independentemente do acordo à esquerda, o PR poderá optar por chamar o líder do segundo partido mais votado no acto eleitoral de Outubro ou deixar Passos Coelho a liderar um governo de gestão.
E Luís Montenegro, líder parlamentar social-democrata, foi directo ao assunto: “Se na terça-feira a aliança negativa dos partidos que perderam as eleições aprovar uma moção de rejeição, o Governo fica demissionário, mas fica naturalmente em funções de gestão até que outro seja empossado e o possa substituir”.